Sociologia em Portugal
Antes da revolução de 25 de Abril de 1974,surgem as Ciências
sociais como um instrumento importante do desenvolvimento da sociedade
portuguesa. Surgem também novas disciplinas, como a Sociologia, Antropologia
Social, Ciências da Educação, etc., sendo criadas diversas licenciaturas e
pós-graduações espalhados por todo o território nacional. Aparecem centros de
pesquisa, normalmente ligados às universidades, constituem-se associações
científicas, aparecem publicações de novas revistas especializadas sobre o
assunto, organizam-se encontros e congressos, ou seja, numa palavra,
consolidam-se as novas ciências sociais, onde a Sociologia irá ter um papel
fundamental na divulgação de novas ideias.
Em
Portugal e até meados do século XX, foram duas as influências verdadeiramente
marcantes na sociedade portuguesa, a do positivismo e a do reformismo
playsiano.
Quanto
à primeira, Teófilo Braga foi o seu grande divulgador, lutando contra uma
filosofia idealista muito forte e hostil, nomeadamente pelas elites
intelectuais, culturalmente retrógradas e politicamente conservadoras. Contudo
o papel central da sociologia que era a reforma da sociedade portuguesa e a
condução para um mundo civilizado e de progresso nunca foi alcançado, pela
falta de produção científica consistente e empiricamente fundamentado.
Tudo
começa em 1908, quando a Sociedade de Geografia de Lisboa, convida J. Durieu,
secretário da Societé
Internationale de Science Sociale, fundada em 1904 a fazer um
ciclo de conferências sobre as teorias da reforma social e o método das
monografias usado pela sociedade nos seus estudos. No ano seguinte, um outro
sociólogo, também discípulo da mesma escola faz um estudo sobre a sociedade
portuguesa, onde são assinalados factores de desorganização social profundos e
continuados e se conclui que as classes sociais e as estruturas das famílias
portuguesas, não favoreciam a emergência dos princípios por que se deviam reger
as sociedades modernas, a saber: valores pessoais sobre a condição social, o
primado do trabalho sobre a política e a abertura ao exterior. São dados assim
os primeiros passos para o sucesso da sociologia em Portugal e em 1918 é criada
no Porto a Sociedade Portuguesa de Ciência Social, a primeira associação de
cientistas sociais formada no país.
O
que é facto é que o reformismo social favorecia o entendimento entre os
diferentes grupos sociais e defendia a correcção coerciva desde que necessária
para preservar o homem da tentação. O reformismo social apoiava-se ou
inspirava-se na doutrina oficial do catolicismo e aproximava-se das soluções
integristas. Não admira, portanto que mais tarde Salazar convide um outro
representante da Escola de Le Play, Paul Deschamps, para replicar o estudo
feito anteriormente sobre a sociedade portuguesa, esperando deste modo
fundamentar os estudos credíveis as opções políticas que tencionava
desenvolver. No entanto os resultados não agradaram ao regime perante o
reconhecimento de Deschamps de que “a concepção de sociedade ditada pelo Estado
Novo não deixava o mínimo lugar a uma disciplina como a sociologia, mesmo que
esta fosse discreta nas menores alusões críticas”.
A
ditadura desconfiava dos sociólogos e das ciências sociais e por isso procurou
sempre desvalorizar qualquer teorização do social e desta forma impedir o seu
desenvolvimento institucional: não permitiu que a sociologia entrasse nas
universidades, não permitiu organizações de índole social, nem a publicação ou
difusão de obras relacionadas com o pensamento sociológico. Isto levou a que
durante décadas, quem se aventurou por este caminho tivesse que o fazer de uma
forma clandestina. O enfraquecimento do regime e a acumulação das contradições
sociais dentro da própria sociedade portuguesa, levantaram enormes problemas
entre a população e não havia como escondê-los. Isto levou a que a década de 60
devido a uma conjugação de factores, desde a tomada de consciência, por camadas
mais amplas, ao atraso da sociedade portuguesa quando comparada com outras
sociedades da Europa e o descrédito do modelo corporativista prometido como
alternativa, transformaram-se rapidamente em preocupações de todos os cidadãos.
Aumentou a procura de conhecimentos especializados na área social e surgiram
instituições de planeamento e intervenção técnica, gabinetes e organismos de
estudos sociais, cobrindo temáticas do âmbito colonial ou relacionadas com com
o serviço social, o desenvolvimento comunitário, a formação profissional e
políticas de desenvolvimento.
Em
1963, surgiu cursos com disciplinas de sociologia e, mesmo uma licenciatura em
Sociologia no Instituto de Estudos Superiores de Évora, mas sem efeitos
notórios para a institucionalização da Sociologia, dadas as preocupações
práticas de formação de profissionais e preocupações ético-religiosas.
Um
verdadeiro marco na história da sociologia em Portugal, acontece em 1963 com o
surgimento da revista Análise Social, projecto de um grupo de
investigadores, quase todos identificados com o progressismo católico, movidos
pelas ideias do desenvolvimento económico baseado no progresso e na justiça
social.
Dava-se
então início à terceira fase do processo de institucionalização da Sociologia
em Portugal. Isto acontece, quer através da criação de novas licenciaturas
noutras universidades, quer através da criação de verdadeiros centros de
investigação sociológica, bem como revistas e publicações periódicas e ainda
através da criação de organismos científicos e profissionais cujos congressos
passaram a constituir eventos marcantes da vida colectiva dos sociólogos
portugueses.
Importa
salientar que o processo de institucionalização da sociologia em Portugal, vai
coincidir com um período, em que a própria sociologia, enquanto disciplina
institucionalizada, atravessava uma fase de reorientação e recuperação de
um período muito crítico, em que toda a produção científica-social,
tinha sido posta em causa em toda a Europa. A crise de que se está a falar
tinha a ver, sobretudo, com o processo de desenvolvimento da própria
sociologia.
De
uma forma sintética e identificando as diferentes variantes da produção
sociológica em Portugal e a melhor prática dessa produção nos últimos anos, eu
diria que os benefícios que a institucionalização tardia da sociologia em
Portugal teve as seguintes vantagens:
ü A abertura interdisciplinar do
trabalho sociológico,
ü A tendência para a auto reflexividade
epistemológica e metodológica,
ü O ajustamento entre dimensão teórica e
dimensão empírica do social,
ü Pluralismo teórico e metodológico,
aliado à rejeição de orientações paradigmáticas exclusivistas,
ü A combinação de metodologias
quantitativas e qualitativas,
ü A articulação de diferentes níveis de
análise, macro, micro, global e local,
ü O interesse por estudos inovadores e
de “fronteira”,
ü A combinação equilibrada entre a
investigação fundamental, a investigação aplicada e a intervenção profissional.
Todos
estes traços não significam outra coisa senão reconhecer que, à partida, as
condições se apresentavam favoráveis ao desenvolvimento de uma sociologia
inovadora e de qualidade, e não envolve qualquer juízo de valor em relação ao
modo como essas condições foram aproveitadas.
Importa
salientar que os contextos mutáveis em que se desenvolveu o trabalho
sociológico, se encarregou de reduzir, nuns casos, e aumentar noutros, as
vantagens comparativas de que os sociólogos portugueses gozavam à partida.
Boaventura
Sousa Santos, a propósito da década de 80, afirma que o contexto socio temporal,
acabou por ser desastroso para a sociologia, por esta não ser capaz de
acompanhar as rápidas transformações que estavam a ocorrer, nem evitar que o
trabalho sociológico se orientasse, paradoxalmente, noutras direcções. Isto
resultou, que devido a certas conjunturas da história portuguesa recente, se
abrandasse a vigilância crítica em relação ao poder instituído:
“A tradição sociológica portuguesa tem alguma
especificidade. Dominou durante muito tempo uma postura crítica. Em dois
momentos, porém, muito diferentes entre si, o compromisso orgânico pretendeu
tomar a dianteira: o primeiro foi durante a crise revolucionária do 25 de
Abril, o segundo, nos últimos quatro anos, em resultado de uma certa
modernização e também de uma certa governamentalização das práticas sociais e
institucionais, ambas impulsionadas pela integração de Portugal na CEE”. E
conclui: “Os desafios que nos
são colocados exigem de nós que saiamos deste pêndulo. Nem guiar nem servir. Em
vez de distância crítica, proximidade crítica. Em vez de compromisso orgânico,
o envolvimento livre. Uma objectividade feita de independência, e não de
neutralidade”.
Finalmente
e voltando ainda ao tardio surgimento da sociologia em Portugal e a sua
relativa marginalidade em face aos principais centros de produção do conhecimento
sociológico, importa realçar a posição defendida em 1988, pelo então Presidente
da Associação Portuguesa de Sociologia, João Ferreira de Almeida: “Sou dos que não consideram forçosamente
negativos todos os efeitos da nossa relativa marginalidade (…). É certo que a
periferia tende a ser candidata a colonização e, no caso que agora nos
interessa, através da importação acrítica de modelos nem sempre adequados ao
trabalho local; mas a situação comporta, também, virtualidades que interessa
ter em conta e aproveitar. A sociologia que se faz em Portugal pode, com
efeito, recolher influxos variados que activamente procure e seleccione, quer
os provenientes dos espaços já referidos, quer os que têm origem noutras fontes
e noutras regiões. As grandes áreas linguísticas e culturais padecem
geralmente de algum isolamento, apesar e por causa da sua dimensão e da sua
preponderância. A nossa pequenez, em contrapartida, obriga-nos à extroversão;
todo o problema reside em aproveitar sem exclusões apriorísticas os contributos
exteriores avaliados como mais positivos”.
Trabalho realizado por:
Fábio Gonçalves Nº18 12ºD
Maria Montrond Nº25 12ºD
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